Instituído na década de 1960 e modificado com a Constituição de 1988, o modelo brasileiro de tributação sobre o consumo tornou-se, ao longo do tempo, complexo, disfuncional, ineficiente, desequilibrado e injusto. Pelo menos desde 1995, o Brasil vive sucessivas tentativas de reforma – todas envolvendo um ponto de consenso: o sistema tributário nacional precisa ser simplificado. No dia 20 de dezembro de 2023, foi promulgada a Emenda Constitucional nº 132, fruto da aprovação da PEC 45/2019. Agora, a Câmara trabalha na regulamentação da Reforma.
Duas novas notas técnicas da Consultoria Legislativa detalham a regulamentação, com uma análise do Projeto de Lei Complementar do IBS, CBS e Imposto Seletivo (PLP 68/2024) e uma síntese do Projeto de Lei Complementar do Comitê Gestor do IBS (PLP 108/2024).
Conheça ainda a nota técnica realizada pelos consultores legislativos Fabiano da Silva Nunes, José Evande Carvalho Araujo, Marco Antônio Oliveira e Aurélio Palos que explica o que foi aprovado. Consulte ainda o quadro comparativo do texto constitucional atual com as alterações trazidas pela Emenda Constitucional, explicando o conteúdo de cada artigo.
O QUE A REFORMA MUDA:
Substitui todos os tributos sobre o consumo por um imposto sobre o valor agregado, pago pelo consumidor final, cobrado de forma não cumulativa em todas as etapas da cadeia produtiva
Os principais tributos atuais sobre o consumo – PIS, Cofins, ICMS e ISS – são substituídos por dois tributos sobre consumo (IBS e CBS) e por um Imposto Seletivo (IS). O IPI foi mantido apenas para servir de diferencial competitivo da Zona Franca de Manaus e terá suas alíquotas reduzidas a zero, exceto para produtos que concorram com aqueles incentivados nesse polo industrial.
O IBS e CBS têm como características:
º Redução de 30% das alíquotas do IBS e da CBS para a prestação de serviços de profissão intelectual, de natureza científica, literária ou artística, desde que sejam submetidas à fiscalização por conselho profissional.
º Lei complementar pode ainda:
º É criada a Cesta Básica Nacional de Alimentos, em observância ao direito social à alimentação previsto no art. 6º da Constituição Federal, tributada com alíquota zero da CBS e do IBS, cuja composição será definida por lei complementar.
º O produtor rural pessoa física ou jurídica que fature menos de R$ 3.600.000,00 por ano pode optar por não ser contribuinte de IBS e CBS, mas poderá repassar crédito presumido aos adquirentes de seus produtos;
º É autorizada a concessão de crédito presumido ao contribuinte adquirente de:
• Devido às particularidades de determinados setores, são criados regimes específicos de tributação para:
º combustíveis e lubrificantes: incidência monofásica; alíquotas uniformes, específicas por unidade de medida e diferenciadas por produto; e possibilidade de concessão de crédito para o contribuinte, desde que o combustível não seja destinado à distribuição, comercialização ou revenda;
º serviços financeiros, operações com bens imóveis, planos de assistência à saúde e concursos de prognósticos, com:
º Sociedades cooperativas:
º Hotelaria, parques de diversão e parques temáticos, agências de viagens e de turismo, bares e restaurantes, atividade esportiva desenvolvida por Sociedade Anônima do Futebol e aviação regional: alterações nas alíquotas e nas regras de creditamento.
º Serviços de transporte coletivo de passageiros rodoviário intermunicipal e interestadual, ferroviário e hidroviário: alterações nas alíquotas e nas regras de creditamento.
º Operações alcançadas por tratado ou convenção internacional, inclusive referentes a missões diplomáticas, repartições consulares e representações de organismos internacionais e respectivos funcionários acreditados
• São ainda previstos tratamentos tributários próprios para:
º Compras governamentais:
º Saldos credores acumulados dos tributos extintos:
O Imposto Seletivo será cobrado para desestimular o consumo de bens e serviços prejudiciais à Saúde e ao Meio Ambiente, como bebidas alcoólicas, cigarros e poluentes. Esse imposto não incide sobre bens e serviços que tenham alíquotas reduzidas em 60% de IBS e de CBS, sobre exportações, nem sobre operações com energia elétrica e com telecomunicações.
Sistema anterior muito complexo
• Tributação sobre consumo com cinco impostos, de três competências diferentes
• A União, os 26 Estados, o Distrito Federal e cada um dos 5.568 municípios tinham competência para ter uma legislação diferente sobre tributos
• Essa complexidade tornava impossível afirmar o exato montante tributário embutido no preço cobrado do consumidor no final da cadeia
• Havia insegurança jurídica na definição de operações que geravam crédito tributário ao adquirente e no enquadramento de operações como mercadorias ou serviços
• Complexidade afastava investimentos estrangeiros: multinacionais relatam ter escritório tributário em outros países com um a dois funcionários, enquanto no Brasil necessitam de mais de 100 funcionários para lidar com a burocracia
• Arrecadação tributária era dispendiosa, com estruturas administrativas paralelas em três níveis de governo
Guerra fiscal
• Estados concediam benefícios fiscais para atrair investimentos, gerando corrosão da arrecadação, ineficiência nos investimentos e legislação mais complexa
• Para compensar desonerações, Estados acabavam onerando mais fortemente produtos consumidos por grande parte da população e em relação aos quais havia pouca alternativa de substituição por outros. Assim, combustíveis, telecomunicações e energia elétrica acabavam muito tributados, o que gerava injustiça tributária e impactava toda a cadeia produtiva
Cumulatividade
• Havia cumulatividade tanto quando se considerava isoladamente tributos incidentes sobre o consumo (PIS/Cofins na modalidade cumulativa e ISS) quanto na análise da incidência entre eles: ISS, ICMS, Pis/Cofins e IPI não geravam crédito entre si e acabavam se tornando custo
• Mesmo nos tributos não cumulativos, como o ICMS, o IPI e o PIS/Cofins não cumulativos, a legislação proibia o creditamento de diversos tipos de insumos, o que gerava cumulatividade
Setor de serviços menos tributado
• Serviços eram menos tributados que mercadorias, pois as alíquotas do ISS eram menores que as do ICMS. Isso trazia certa injustiça tributária, já que serviços são proporcionalmente mais consumidos por famílias de renda superior
• Muitos municípios pequenos não cobravam o ISS, pois não possuíam estrutura administrativa suficiente para essa cobrança
• Como a tendência observada nos tribunais brasileiros é que a economia digital seja tributada como serviço, sua expansão acentuava a diferenciação existente na tributação de bens e serviços hoje na economia, corroendo a base tributária do consumo
IMPACTOS PREVISTOS
A Reforma tributária possui o potencial de gerar crescimento adicional da economia (PIB) superior a 12% em 15 anos. Hoje, isso representaria R$ 1,2 trilhão a mais no PIB de 2022.
Todos os setores da economia acabaram sendo beneficiados pela reforma.
Redução das desigualdades sociais por meio de uma tributação mais justa, beneficiando parcelas mais pobres da população.
Impostos passaram a ser cobrados “por fora”
Uma característica peculiar da tributação brasileira anterior é que a incidência das alíquotas de alguns tributos era feita “por dentro”. A alíquota efetiva (real), que corresponde ao valor que o contribuinte realmente paga, era maior do que seu valor nominal, pois o imposto compunha sua própria base de cálculo. A Reforma deu mais transparência ao consumidor sobre esse valor pago, ao definir que a alíquota passa a ser calculada “por fora”, ou seja, o valor da alíquota informada é equivalente ao cobrado do contribuinte e não há mais imposto “escondido”.
Conheça a nota técnica que analisa o Projeto de Lei Complementar do IBS, CBS e Imposto Seletivo (PLP 68/2024) e uma síntese do Projeto de Lei Complementar do Comitê Gestor do IBS (PLP 108/2024).
Texto: Carolina Nogueira Infográfico: Pablo Alejandro | Rafael Teodoro – Agência Câmara de Notícias – 22/02/2024