Por que regular as plataformas pode combater as fake news?

A tecnologia muda o mundo rapidamente. À medida que novos produtos e sistemas são desenvolvidos, novas formas de consumo, necessidades e desafios vão surgindo. Assim, também a legislação pensada há pouco tempo logo não consegue mais resolver os novos problemas – e é preciso atualizar as leis para garantir o uso democrático das novas ferramentas.
Uma nota técnica realizada pelos consultores Claudio Nazareno e Guilherme Pereira Pinheiro passa em revista as inovações que a tecnologia impôs à sociedade e os principais marcos legais que tentam dar conta dessas mudanças. Entenda o contexto de criação e os principais aspectos da proposta em discussão no Congresso que busca assegurar a liberdade de expressão e dar maior transparência no combate às fake news.

COMO A TECNOLOGIA EVOLUIU

E as respostas da legislação

Economia da atenção é como se convencionou chamar uma nova forma de se gerar negócios baseada em cativar a atenção do usuário pelo maior tempo possível, mediante um excesso de estímulos, informações e impulsos mantendo o usuário/consumidor dentro dos “domínios” de uma determinada empresa e gerando dados acerca de seu comportamento e desejos e necessidades.

Assim como os canais da televisão tradicional buscam formas de manter os telespectadores sintonizados pelo maior tempo possível, os aplicativos também dependem dessa atenção permanente. Para conseguir isso, as empresas se utilizam cada vez mais de algoritmos para classificar, direcionar ou priorizar os tipos de conteúdo de acordo com o perfil de seus usuários.

Isso gera maior engajamento e conexão entre pessoas com quem se compartilham interesses, mas também o efeito negativo da bolha social: a exclusão da discussão de pensamentos contrários e do pensamento crítico, extremismos, manipulações, desinformação, notícias falsas. Diversos estudos apontam para possíveis malefícios desse excesso de estímulos e de tempo de conexão que fragmenta e dificulta a capacidade humana de focar a atenção em uma tarefa ou informação.

Como a legislação pode conter alguns dos aspectos negativos?

Principais aspectos do substitutivo ao PL 2630/2020

A proposta cria regras que serão aplicáveis a redes sociais (como Facebook e Instagram), buscadores (como Google e Bing) e mensagens instantâneas (como Whatsapp e Telegram), com mais de 10 milhões de usuários

As plataformas têm obrigações protetivas escalonadas em três níveis:

1º nível

Análise e atenuação de riscos sistêmicos: Desde a concepção das plataformas. Deve criar mecanismos de monitoramento de todo o conteúdo circulante de modo a identificar, analisar e avaliar eventuais riscos e definir procedimentos a serem adotados quando surgirem conteúdos ilícitos

2º nível

Monitoramento contínuo/dever de cuidado: quando notificada por usuário, a plataforma deve atuar de forma a prevenir e mitigar práticas ilícitas

3º nível

Monitoramento excepcional/risco iminente de danos: protocolo de segurança por trinta dias quando houver fundados elementos que caracterizem risco iminente de danos

As plataformas podem ser responsabilizadas civilmente se não agirem diligentemente para moderar conteúdos que possam configurar crimes:

Contra o Estado Democrático de
Direito

Terrorismo

Previstos no Estatuto da Criança e do Adolescente

Ofensas raciais ou de gênero

Contra a saúde pública

Transparência no algoritmo

As regras básicas utilizadas para a recomendação e direcionamento de conteúdos devem ser públicas

Auditoria externa e independente obrigatória

com relatórios de transparência que devem atestar o atendimento de cada nível de obrigação

Proibidos ranqueamentos artificiais

Plataformas musicais e audiovisuais são proibidas de promover ranqueamentos artificiais baseados em acordos comerciais

Autoridade de regulação

Não há uma autoridade de regulação, mas foi apontado o Comitê Gestor da Internet (CGI), formado pelo governo, empresas, terceiro setor, comunidade científica e autoridades no tema, como órgão responsável por realizar diretrizes para a elaboração de códigos de conduta, que serão elaborados pelas plataformas e validados pelo órgão

Jornalismo remunerado por plataformas

A remuneração do direito de autor, já prevista para conteúdo musical e audiovisual, passa a valer também para a remuneração de conteúdos jornalísticos

Pornografia infantil: plataforma responsabilizada

Incluída responsabilização subsidiária para as plataformas para o caso de veiculação de conteúdos sexuais de criança e adolescente, similar ao existente para a pornografia da vingança, mediante alteração no Marco Civil da Internet.

Identificação de usuários que compartilham endereço de IP

Altera o Marco Civil da Internet para possibilitar a identificação do usuário que utilize IP compartilhado

Publicidade deve ser identificada, e seus financiadores também

Limitar distribuição em massa

Serviços de mensageria (como Whatsapp e Telegram) devem ter mecanismos para tal. Regras são aplicáveis a redes sociais, buscadores e serviços de mensageria instantânea com mais de 10 milhões de usuários mensais

Contas de agentes públicos

Não podem ser restritas e haverá incentivo à educação digital

Texto: Carolina Nogueira Arte: Thiago Fagundes – Rafael Teodoro – Agência Câmara de Notícias – 23/06/2023